quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Visão

Gosto de me parar à beira da janela. Ter algo em mãos, um copo de água, uma xícara de chá verde, caneta e papel, cigarro, porque minhas mãos não devem nunca ficarem desocupadas, desse jeito elas revelam segredos demais, e ver a vida alheia passar junto com a minha minha. Penso no que elas devem estar pensando, penso na direção , no caminho e no destino que elas estão tomando - e a direção e o caminho são mais importantes que o destino - ou se elas estão simplesmente à deriva da cidade e das suas ruas, e das vielas, e das poucas avenidas, sem destino prévio nem caminho traçado. À deriva, o destino é onde simplesmente decidimos, ou o destino nem existe. Podemos nos deter em algum lugar e aquilo não será o final. É só um nó no emaranhado de fios do caminho e do roteiro acíclico.
Em cada olhar, em cada perspectiva, um pouco de mim fica, ou pelo menos imagino que sim.

Me faria enormemente feliz poder me parar à beira da janela e sempre poder enxergar um lugar diferente e esmiuçar vidas diferentes e derivas diferentes. Destinos diversos e caminhos indescritíveis, poiso traçado deles é o traçado da vida e no traçado da vida não há destino - não pense que é a morte. Queria poder abrir a janela e ver a China, ou ver uma parte da floresta amazônica, um vilarejo na Toscana, Queops e Quéfren e suas irmãs mortuárias egípcias, cangurus na Austrália, praias na Indonésia, templos hindus, castelos japoneses de papel - o cimento oriental, o parque municipal de Belo Horizonte, algum paraíso escondido no México, um gêiser islandês, a Jamaica de Bob, um deserto gelado no Alasca, um deserto em fogo como o Saara, ou do Atacama, ou o fogo dentro de mim que vem de Marte. Queria provar o que meus olhos ainda não provaram. Meu paladar virgem e adormecido, minha audição pequena e meu olfato destreinado. Um amor novo e, porque não, diferente.
Experiência.

Um comentário:

Rita disse...

adoro a forma que você tem, de escrever. agora. porque ela mudou, gosto dela antes e gosto mais ainda dela agora.

você,que mesmo sem saber, sempre me lê.

a primeira vez que você me leu foi com a seguinte frase, num tempo longiquo: "A gente tem o que precisa, não o que merece" e ainda: "o tédio é um pecado que cometemos contra nós mesmos"

:*